Bolsonaro foi uma doença, que por mais grave que parecesse acabaria passando. Entrará para a história como o único presidente do Brasil que até aqui não conseguiu se reeleger. E como o pior presidente da história desde o fim da ditadura.
Tão logo sua derrota se desenhou, trancou-se no Palácio da Alvorada e não recebeu ninguém – nem os ministros mais chegados, nem seu candidato a vice, o general Braga Neto. No domingo, acordara convencido de que seria reeleito.
Não se preparou para a eventualidade de perder. Perdeu para Lula, que governará o país pela terceira vez e à sombra de quem transcorreu todas as eleições presidenciais de 1989 para cá; mas perdeu sobretudo para si mesmo. Abusou de errar.
O maior adversário de Bolsonaro foi Bolsonaro. Natural que fosse. No início de 2018, quem diria que aquele deputado federal do baixo clero, que nunca aprovou um projeto na Câmara, parasita dos militares que queriam distância dele, se elegeria presidente?
Ele estava cansado da sua desimportância e planejava desfrutar o resto da vida na companhia de Michelle e de Laura, a filha que nascera “de uma fraquejada”. Concorrendo à presidência, impulsionaria a carreira política dos filhos e iria descansar.
Era o que lhe bastaria. De repente, ao acordar da operação que em Juiz de Fora salvou sua vida, deu-se conta de que seria eleito. “Agora, é só administrar”, murmurou ainda sob efeito da sedação. Teve uma crise de choro no dia em que se elegeu e ficou em casa.
Não teria o que dizer às dezenas de jornalistas brasileiros e estrangeiros reunidos para ouvi-lo em um hotel da Barra da Tijuca. Precisava acostumar-se à ideia de que governaria o país por quatro anos sem dispor de um plano, nem de mínimas condições para tal.
Quando acordar hoje, terá de fazer uma escolha que definirá seu futuro: reconhecer ou não a derrota. Se reconhecer e facilitar a transição para o próximo governo, poderá sonhar, pelo menos sonhar, em liderar a oposição ou parte dela de olho em 2026.
Se não reconhecer, se disser que a eleição foi fraudada, seu destino será a lata do lixo. Quem o apoiaria na aventura de tentar melar as eleições? Os militares? Esqueçam. Eles choram a derrota que também foi deles, mas em breve baterão continência para Lula.
O Centrão? Piada. O Centrão já está em outra. Não jogará fora das “quatro linhas da Constituição” porque só ganha jogando dentro. Lembrem-se: em 1964, a maioria dos políticos acreditava que a ditadura seria algo fugaz. Não foi. Durou 21 anos.
Em 1961, ao renunciar à presidência com apenas seis meses no cargo, Jânio Quadros voou a São Paulo carregando a faixa que recebera de Juscelino Kubistchek e que enfeitou o peito de todos que o antecederam. Jânio imaginou voltar nos braços do povo.
Teve que devolver a faixa que, mais tarde, enfeitaria o peito dos generais que o sucederam na presidência. O último deles foi João Baptista de Oliveira Figueiredo, um oficial da Cavalaria, que ao saber que passaria a faixa a José Sarney, negou-se.
Figueiredo poderia ser melhor lembrado pela história, afinal deu continuidade à política de abertura política inaugurada pelo general Ernesto Geisel, concedeu a anistia aos exilados e presos políticos e resignou-se a ir embora – mas, não.
O general é lembrado por ter saído do Palácio do Planalto pelas portas do fundo para não cruzar com Sarney. Na verdade, foi por uma porta lateral, mas a história é impiedosa. Figueiredo não acabou no Irajá, mas na Barra da Tijuca a mendigar atenção.
Bolsonaro tem casa em um condomínio na Barra da Tijuca. E sempre terá Fabrício Queiroz, o administrador da rachadinha dos filhos Zero, para pescar com ele. Queiroz candidatou-se a deputado federal pelo Rio e perdeu. Serão dois sem mandato.
Fonte: Metrópoles