Declarações polêmicas e tidas como antidemocráticas, disparadas pelo procurador do Estado de Mato Grosso do Sul, Felipe Marcelo Gimenez, numa entrevista a uma emissora de rádio de Campo Grande, pode enrascar judicialmente o ex-presidente Jair Bolsonaro, do PL, que reproduziu as falas em sua rede social.
Bolsonarista declarado, Gimenez disse que quem elegeu Lula presidente foi o STF (Supremo Tribunal Federal) e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), não os eleitores brasileiros e instigou a população incrédula com o resultado eleitoral a seguir para os protestos em frente aos quarteis.
A entrevista ocorreu no dia 13 de novembro passado e foi noticiada, à época, pelo Correio do Estado. A PGE (Procuradoria Geral de MS), que emprega Gimenez avisou semana passada, por meio de nota que foi instaurado procedimento, no âmbito da Corregedoria, para apurar a conduta do procurador.
Assim que divulgada as conversas do procurador, a PGE manifestou-se, ainda, desse modo: “A Procuradoria-Geral do Estado de Mato Grosso do Sul, instituição essencial ao bom funcionamento do Estado Democrático, reafirma sua confiança no processo eleitoral e o respeito às autoridades estaduais e nacionais responsáveis pela sua realização, não representando a posição desse órgão eventuais manifestações individuais de integrantes de seus quadros”.
Ou seja, a repartição estadual repugnou as declarações de seu procurador.
Bolsonaro encrencado
De acordo com o colunista Josias de Souza, do site UOL, em publicação neste domingo (15), o ex-presidente foi incluído como investigado no inquérito 4.921, que apura a “instigação e autoria intelectual dos atos antidemocráticos” que resultaram na invasão e depredação das sedes dos Três Poderes, graças ao compartilhamento de um vídeo no Facebook.
O vídeo com a entrevista de Gimenez foi compartido no perfil do ex-presidente. Diz o publicado que o procurador de MS difundia mentiras sobre as eleições de 2022.
Ainda conforme o colunista, de acordo com um ex-ministro de Bolsonaro, ouvido por ele, Carlos Bolsonaro, filho do ex-presidente, dispõe das senhas de todos os perfis mantidos pelo pai nas redes sociais. Suscita a ideia de que o ex-mandatário não seria o responsável pela publicação e, sim, o filho.
A republicação do vídeo com as falas do procurador de MS foi feita às 21h55 do dia 10 de janeiro, pouco mais de 48 horas depois da invasão dos prédios do Congresso, do Planalto e do Supremo por falanges bolsonaristas, informou o colunista.
As declarações foram tiradas do ar na madrugada do dia 11 de janeiro, período em que a peça já viralizava nas redes sociais.
Bolsonaro foi incluído no inquérito a pedido da Procuradoria-Geral da República, aceito pelo ministro do STF, Alexandre Moraes.
Para sustentar o despacho que concordou com a apelação contra o ex-presidente, Moraes citou outras atitudes de Bolsonaro ligadas a disseminação de notícias falsas acerca das vacinas contra a covid e ainda o vazamento de investigação de ataque aos computadores do Tribunal Superior Eleitoral.
Intervenção
No diálogo do procurador, de acordo com noticiado pelo Correio do Estado, no dia 11 de novembro passado, ele diz que “cabe a intervenção das Forças Armadas para reestabelecer a Ordem”.
Segundo a reportagem do Correio, na entrevista Gimenez acusou o presidente TSE, Alexandre de Moraes de ameaçar, caluniar e cometer crime de tortura contra os bolsonaristas que não concordam com o resultado das urnas, além de compará-lo com o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, e dizer que o ministro usa o cargo público para “causar sofrimento físico e psíquico nas pessoas.”
Ainda na entrevista em questão o procurador do Estado de MS convocou a população para participar dos atos promovidos desde o dia 31 de outubro na frente do Comando Militar do Oeste (CMO), em Campo Grande. As manifestações não acontecem mais há uma semana, por determinação judicial.
“A população não aceitou e não deve aceitar, o cidadão precisa acordar, sair da rotina”, disse o procurador, que acrescentou: “se as pessoas continuarem só no whatsapp batendo palminhas, nós vamos chegar ao mesmo lugar que os venezuelanos chegaram”.
Ainda na entrevista à emissora de rádio, o procurador disse que a maioria do povo brasileiro não sabe o que é democracia: “na verdade nem os senadores e deputados, a maioria. O Congresso Nacional e o Senado são uma plantação de analfabetos”, afirmou o procurador do Estado de MS.
Lula foi eleito com 60.345.999 de votos (50,9% dos votos válidos), ante os 58.206.354 de Bolsonaro (49,1%).
Já sofreu protesto
No dia seguinte à entrevista do procurador, o deputado estadual eleito de MS, José Orcírio dos Santos, o Zeca do PT, informou ao Correio do Estado, que ia protestar contra a sustentação de Gimenez, no STF e também no MPF (Ministério Público Federal).
“Denunciei [procurador] pois ele levanta uma inverdade, uma mentira muito grave contra o TSE, dizendo que quem elegeu o Lula foi o sistema eleitoral e não o povo. Isso é de uma gravidade, uma tentativa de botar em dúvida o processo democrático reconhecido no mundo todo que o Brasil viveu eleitoralmente. Além do que, incentiva os atos de baderna antidemocráticos que cada vez mais se esvaziam. Denunciei ele para o governador Reinaldo Azambuja (PSDB), para o governador eleito Eduardo Riedel (PSDB) e encaminhei para a página do STF pedindo providência em relação a isso”, afirmou, em novembro passado, Zeca do PT.
Já a Ordem dos Advogados do Brasil, seção Mato Grosso do Sul, afirmou à época que não comentaria sobre as eleições e manifestações, apenas falaria de assuntos que envolvam a advocacia.
O procurador Gimenez ainda não se manifestou acerca da republicação das declarações suas que podem complicar judicialmente o ex-presidente.
Fonte: Correio do Estado – Colaborou Leo Ribeiro