Ribeiro foi exonerado nesta segunda-feira (28/03) pelo presidente, Jair Bolsonaro (PL), em meio ao agravamento da crise que começou após reportagens apontarem que pastores evangélicos estariam cobrando propina para liberar verbas da pasta.
Em jogo está o terceiro maior orçamento do governo federal, estimado em R$ 159 bilhões. Um dos nomes mais cotados para comandar a pasta é o de Garigham Amarante Pinto, um advogado ligado ao ex-deputado Valdemar Costa Neto – condenado no caso mensalão, e um dos principais líderes do PL, atual partido de Bolsonaro.
Os rumores sobre a queda de Ribeiro ficaram mais fortes na manhã desta segunda-feira. Até então, especulava-se a possibilidade de ele se licenciar do cargo para responder às investigações sobre o caso. Sua demissão, no entanto, foi publicada na edição desta segunda-feira do Diário Oficial da União (DOU). Segundo o documento, a exoneração foi pedida por Ribeiro e aceita por Bolsonaro.
Quem deverá comandar a pasta até a definição do novo ministro é o secretário-executivo da pasta, Victor Godoy Veiga, servidor de carreira da Controladoria-Geral da União (CGU).
Ministério disputado
Ribeiro assumiu o comando do MEC em 16 de julho de 2020, após uma série de crises na liderança da pasta. Desde o começo do governo Bolsonaro, o ministério vinha sendo alvo de disputas pelo seu comando.
Inicialmente, o embate se deu entre as alas militar e ideológica, fortemente influenciada por pessoas ligadas ao escritor Olavo de Carvalho, morto em 2021.
Depois que o governo fez uma guinada em direção ao Centrão em busca de apoio político, o bloco passou a fazer parte da disputa pelo controle da pasta.
No ano passado, o presidente Bolsonaro selou uma aliança com o bloco ao apoiar a candidatura do deputado Arthur Lira (PP-AL) para a Presidência da Câmara dos Deputados e ao nomear o senador Ciro Nogueira (PP-PI) para a chefia da Casa Civil.
Embora não haja uma definição rígida sobre quais partidos fazem parte do grupo, uma legenda que muitas vezes esteve próxima ao Centrão, o DEM, já comandou o MEC entre maio de 2016 e abril de 2018. À época, o ministro foi o ex-deputado federal Mendonça Filho.
O principal interesse do Centrão no MEC está no volume do seu orçamento e pela capilaridade de suas ações. O ministério repassa recursos e desenvolve projetos em praticamente todos os municípios do país.
Em um ano eleitoral, o comando da pasta é avaliado como um ativo importante para viabilizar candidaturas, especialmente no interior do país. Além disso, o MEC também é responsável pela regulação da criação e funcionamento de instituições de ensino superior privadas, um mercado bilionário no Brasil.
Apesar de ter bom trânsito no meio político, Milton Ribeiro não era visto como um nome da ala política do governo, hoje comandada pelo Centrão. Ele tinha respaldo de diversas lideranças evangélicas próximas ao presidente.
Mas a crise gerada após uma série de denúncias sobre a participação de pastores em uma espécie de “gabinete paralelo” no MEC vinha erodindo esse apoio. O pastor Silas Malafaia, da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo, cobrou, nesta segunda-feira, que Ribeiro fosse exonerado.
A crise envolvendo pastores
As denúncias envolvendo a gestão de Ribeiro começaram há pouco mais de duas semanas com reportagens publicadas pelos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo.
Segundo elas, dois pastores evangélicos estariam cobrando propina de prefeitos em troca de acesso ao ex-ministro e para acelerar o processo de liberação de verbas do Fundo Nacional para Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Em um áudio divulgado pela Folha de S.Paulo, Ribeiro disse que sua prioridade era beneficiar as cidades mais necessitadas e, depois, os gestores que fossem próximos aos dois pastores. Ainda de acordo com o áudio, ele afirma que essa priorização havia sido pedida pelo presidente Jair Bolsonaro.
Após as denúncias, Ribeiro deu entrevistas negando ter cometido qualquer irregularidade e que ele mesmo havia encaminhado duas denúncias sobre o caso para a Controladoria Geral da União (CGU). Em uma carta divulgada nesta segunda-feira, Ribeiro ele voltou a dizer que não cometeu nenhum ato irregular.
“Tenho plena convicção que jamais realizei um único ato de gestão na minha pasta que não fosse pautado pela correção, pela probidade e pelo compromisso com o erário. As suspeitas de que uma pessoa, próxima a mim, poderia estar cometendo atos irregulares devem ser investigadas com profundidade”, afirmou.
Na quinta-feira (24/03), Bolsonaro chegou a demonstrar apoio a Ribeiro durante uma transmissão ao vivo em suas redes sociais. Ele disse que as críticas ao ministro eram uma “covardia” e que ele colocaria sua “cara no fogo” pelo então ministro.
Na mesma transmissão em que Bolsonaro disse que colocaria sua “cara no fogo” por Ribeiro, ele também reclamou de pessoas próximas que estariam indicando nomes para substituir o ministro.
“Tem gente que fica buzinando: ‘Manda o Milton embora que a gente tem alguém pra indicar aqui’. Duvido botar para o público o nome, não faz isso porque se der errado a culpa é minha”, disse o presidente.
Centrão de olho
Fortalecido, o Centrão é o grupo favorito dentro do governo para emplacar o novo comando do MEC. O nome mais especulado para assumir o lugar de Ribeiro é o do diretor de ações educacionais do FNDE, Garigham Amarante Pinto.
Ele também atuou como assessor de parlamentares do atual PL, partido do presidente.
A pressão para obter o comando do MEC durante o governo Bolsonaro é mais um movimento de uma sequência que se intensificou a partir de 2020, quando o bloco começou a emplacar alguns nomes para cargos importantes na estrutura do ministério.
O principal deles é o presidente do FNDE, Marcelo Lopes da Ponte, que assumiu o cargo em 2020 e era chefe de gabinete de Ciro Nogueira. O ministro da Casa Civil é hoje um dos principais estrategistas da campanha à reeleição de Bolsonaro. Na época, a ala conhecida como ideológica do governo reagiu e fez críticas sobre o avanço do Centrão em direção ao ministério.
O FNDE funciona como se fosse uma espécie de “banco” vinculado ao MEC e é responsável pelo repasse de verbas destinadas à educação básica em todo o país. Em 2022, o órgão tem um orçamento de R$ 64 bilhões para 2022.
Para o professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, Daniel Cara, a brecha para o Centrão aberta pela queda de Milton Ribeiro é motivo de preocupação.
“O Centrão sempre desejou a pasta da Educação. Eles já tinham o comando do FNDE e agora podem ter o ministério inteiro. Isso tem implicações porque antes eles só controlavam os repasses de recursos. Agora, poderão ter acesso ao órgão que formula as políticas públicas de educação”, afirmou.
Segundo Daniel Cara, a eventual chegada do bloco ao comando do MEC pode ter impactos diretos em setores como a regulação da educação superior privada.
“Há muito interesse de alguns setores ligados ao Centrão nos setores que controlam a abertura de novos cursos universitários. Creio que podemos esperar uma grande pressão para a abertura de cursos, especialmente de Medicina, porque são cursos que dão maior retorno financeiro para centros universitários”, disse.
Fonte: BBC